Foco na atenção primária e coordenação multiprofissional aumentam a percepção de valor dos clientes, como a carioca Araci Costa
Uma ampla rede referenciada, com muitos hospitais de elite e médicos renomados formavam o pacote de um plano de saúde atraente para o consumidor. Essa tendência, porém, está mudando. As novas startups da saúde prometem utilizar o big data e focar em atenção primária e cuidado integrado para garantir resultados melhores para os pacientes.
Entre as empresas consolidadas, esse modelo, que tem início no atendimento preventivo, também começa a ser explorado, e com retorno positivo dos pacientes, como é o caso da carioca Araci Costa. Depois de 40 anos como cliente de uma das maiores operadoras do Brasil, ela recentemente mudou seu plano de saúde e se surpreendeu. A nova empresa ofereceu um atendimento mais próximo, em que uma enfermeira a visitaria em casa regularmente e ficaria responsável por suas necessidades assistenciais.
“Jamais um médico ou enfermeira veio à minha casa. O plano anterior havia começado um programa de médico da família, mas para orientar o paciente por telefone. Aqui é diferente. A equipe é proativa e interativa”, elogia.
Araci Costa, cliente da Laços Saúde
Atendida pela enfermeira Lusivalda Pimentel, da Laços Saúde, Araci teve uma boa impressão logo no início, ao perceber que a profissional usou toda a paramentação para protegê-la do risco de infecção pelo coronavírus.
“Ela foi super acolhedora, mostrou-se uma pessoa de alto gabarito, competente, consciente. Mediu minha pressão e glicemia, auscultou e perguntou há quanto tempo eu não ia a uma consulta. Aí ela mesma fez tudinho: marcou a consulta para mim, mandou o link e explicou como entrar.”
Araci não teve dificuldades com a teleconsulta e conseguiu colocar os exames em dia, como a mamografia, que não fazia há dez anos. Na longa conversa que manteve com a geriatra Kylza Estrella, ficou sabendo que, pela telemedicina, a profissional acessaria seus exames e já teria clareza de como orientá-la na teleconsulta de retorno. Assim, não precisaria se deslocar para somente entregar os resultados dos exames.
Agora, terá também o apoio da psicóloga Isabel Moura, de uma fisioterapeuta e de uma nutricionista, que trabalharão em conjunto com a médica e a enfermeira para aumentar sua qualidade de vida e prevenir riscos de doenças. “Tenho amigas que moram nos Estados Unidos e elas contam que só os muito ricos têm isso. Nunca pensei que teria esse atendimento de Primeiro Mundo aqui. Percebo que é um dinheiro muito bem empregado, porque é uma empresa que se preocupa com a minha saúde”, conta.
Estamos tentando resolver problemas de saúde do século XXI com uma assistência do século XX. Passamos por uma transição epidemiológica, mas o sistema de saúde não acompanhou”, sintetiza o professor Eugênio Vilaça Mendes, Consultor do Conselho Nacional dos Secretários de Saúde (Conass), durante o Anahp Ao Vivo.
O professor defende um sistema de cuidado integrado que pense tanto nos doentes agudos como nos crônicos, com uma rede de atenção à saúde multidisciplinar e que torne o paciente agente de sua própria saúde, por meio do autocuidado.
Formada em pediatria e com doutorado em envelhecimento, Martha Oliveira também participou do Anahp ao Vivo e compartilhou as distintas realidades que viveu em sua prática profissional. Martha defende uma visão holística do paciente, que prime por mantê-lo conectado à sociedade.
“Como podemos atender bem o paciente sem saber como ele está estruturado na comunidade, sem entender que relação ele tem com a rede de apoio formal e informal, se ele tem um médico assistente?”, questiona.
Martha Oliveira, diretora-executiva da Laços Saúde
Em busca de respostas para oferecer um cuidado de saúde mais efetivo, especialmente para o paciente idoso, a Laços Saúde apostou no método holandês buurtzorg, liderado por enfermeiras e que tem a casa como principal ponto de atendimento do paciente. “É um método que se acomoda a diferentes perfis de saúde populacional, de organização e de estrutura, com foco na manutenção da funcionalidade e nas necessidades de cada paciente”, explica a diretora-executiva da Laços Saúde.
Martha defende uma articulação melhor entre os diferentes níveis de cuidados e profissionais envolvidos na assistência, para que esse interesse renovado na atenção primária e no cuidado integrado não se torne uma panaceia. “Senão, criaremos mais uma bolha, uma instância não articulada que não vai servir para nada. Nossa realidade hoje é de um paciente com seis médicos assistentes, três caixas de sapatos cheias de medicamentos e instruções escritas na tampa, mas que quando passa mal acaba na Emergência, porque não tem médico de referência.”
Mais do que melhorar o cuidado ao idoso, a atenção integrada permite também que esse paciente tenha mais qualidade de vida e trate de questões que vão além de sua saúde. “Tem idoso que vive só para ir ao médico: liga no call center para marca consulta, marca com especialista errado, busca outro, faz exame, volta ao médico… Quanto tempo é gasto nisso? Isso tudo poderia ser evitado. É estressante, traz um grande desgaste emocional. Quero alguém que cuide da minha saúde, para sobrar tempo para fazer o que eu gosto”, relata Araci.
Com essa nova acolhida e dentro de um modelo de cuidado integrado e coordenado, Araci está satisfeita. Tem tempo para ir à academia, assistir filmes e documentários, manter longas conversas com o filho Fabio e dedicar-se ao movimento esperantista, ao qual pertence há mais de 15 anos. Tudo isso enquanto também se adapta às mudanças corporais ao longo dos anos e enfrenta o o etarismo.
“O idoso é muito discriminado na sociedade ocidental, não goza de respeito. Optar pela vida é ato político e eu escolho sobreviver”, conclui.